quarta-feira, 11 de julho de 2018

NO JARDIM DA LEOPOLDINA



In memoriam a Hilda e Wellington Drumnond

Toda vez que eu vejo uma uva, lembro:
Quando chegava na casa dos Drumnond, me sentia todo bobo. Me achava pertencente a família do grande Carlos Drumnond de Andrade. Os seus poemas sempre me encantaram. Essa percepção poética só aconteceu bem depois das uvas que ficavam penduradas na garagem. Não tinha carro. Engraçado, nunca vi carro ali. Uma garagem sem carro, mas cheio de uvas. Poesia-objeto. Encanto. Carlos você está aí escondido na videira?
 Eu ainda não tinha altura suficiente para pegá-las. Do lado, perto da outra garagem que sempre estava fechada, um menino malvado que imitava Popeye gostava de me bater e comer as folhas da videira como se fosse espinafre. Deveria ter sido Brutus. Coisa de criança? Nunca entendi.
Entra meu filho, conheça as memórias do meu pai, o Sr. Lamenhas Cavalcante. Posso sentar nessa cadeira Tia Hilda? A entrevista que nunca aconteceu, anunciou o inverno. As palavras saiam de sua boca feito rosas do povo.
Os anos de sua vida contavam as suas histórias. É bom tomar café na cozinha em dias enluarados. Bolos de aniversário com cajuzinho e brigadeiro. O suco é de uva. As folhas de espinafres podem se transformar em comidinha de boneca. Cuidado, isso é coisa de menina. Vai virar mulherzinha.
Peter Pan sempre aparecia nos momentos que eu precisava. Em cima de um caminhão o meu Bisa veio tocando os “boi” lá dos sertão do Ceará. Tanta coisa pra contar. Salve a cultura popular. Um bumbo que toca na multidão anuncia o moço de olho azul. Eita tio, você é da Europa? Eu vim das Minas, torcendo pro frio chegar. Ê tá cidadezinha quente.
Vem cá! Escuta bem! Conheço o teu paizinho desde pequenininho. Sempre apaixonado. Gostava de escrever poesia para sua mãe. Pegava o bonde bem aqui na esquina pra descer na Estação Leopoldina. Nessa época tinha trem até para o Rio de Janeiro. O tempo costuma me encontrar nas esquinas da vida. No jardim tinha tantas outras flores. De vez em quando eu sentia os seus odores. A minha professora de história que eu nem lembro mais me dizia que Leopoldina era uma princesa. Estou com uma vontade de tomar um vinho.

Resende, 11 de julho de 2018.
Rudi Rot

Album de fotos Viagem para o Rio